segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Maçãs vermelhas

E deixar pra trás todas essas varandas?
Deixar escrito flores, floricultura,
gotas de chuva?
Deixar aqui toda essa
coca-cola-chiclete-cinzeiro?
E tem tanto som em minha garganta!
Pra trás deixar um pomar de plástico
com frutas de isopor em terra
de vidro em pó e farinha de trigo,
porque pisar nesse veludo e
beijar a cara amassada
do travesseiro mal dormido
em noite de sol,
já não convém ás minhas divagações
levemente trincadas, restauradas com
goma à base de pólem, alcatrão e trivialidades.
E num dia, hoje talvez, romper a cápsula
guardiã da fluorescência magnífica que adjetiva
a tal poliglota refinada musicista
pra permanecer intacta e repousante
no seu cotidiano maléfico, sangue,
nervos e tecidos, sejam tecidos
estampados ou negros, não importa
porque a porta do sorriso sempre fica aberta.
E deixar tudo isso pra trás?
São tantas frutas brotando!
Talvez eu deixe ou leve pra trás.
Talvez, uma vez, não sei.
Talvez tudo não passe de um belo pomar.

Um comentário:

  1. Já disse e reafirmo que aprecio os seus poemas sequenciais de roteiros complexos. Maçãs vermelhas é até agora o mais intricado e o mais soberbo, evoca o passado, o pecado, o desconforto, a desolação...mas é um filmeverso sem remorsos...quebra cenários, troca diálogos por monólogos...mas conserva a essencia da sua estória. Do outro lado há espectadores, cada um com o seu imaginário...muitas vezes o imaginário é terrivelmente próximo do real, ou seja, tem os seus desvios...outras vezes ainda, de certa forma rara, apenas tenta preservar o seu campo imaginético...apenas transfere para conservar o seu poder de mistério!

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